Entrevista publicada na revista Violo Pro, n. 15, So Paulo, 2007.

 

Multimdia!

 

Um dos maiores violonistas brasileiros da atualidade, Daniel Wolff aprimora seus estudos na Alemanha e lana CD com obras famosas de Beethoven, Schubert e Chopin

 

Por Fbio Carrilho e Gilson Antunes

 

 

Artista ecltico, Daniel Wolff o prottipo do msico profissional moderno. Intrprete brilhante, dono de amplos recursos tcnicos no instrumento e de uma formao acadmica admirvel o primeiro brasileiro a obter o ttulo de doutor em Violo, pela prestigiosa Manhattan School of Music, de Nova York o violonista vem obtendo destaque em seus diversos campos de atuao, seja como concertista, arranjador, compositor, pesquisador e didata. Vencedor de diversos prmios, incluindo um Grammy como arranjador, Wolff tem se apresentado com regularidade pela Amrica do Sul, Europa e Estados Unidos. Suas parcerias com o violonista Daniel Gritz e o clarinetista Wilfried Berk deram origem aos seus CDs mais recentes, New Transcriptions for 2 Guitars e Coisas da Vida.

 

 

Natural de Porto Alegre, Daniel Wolff iniciou no violo bem jovem. Comecei aos 12 anos, tocando msica popular. Um ano depois passei para o violo clssico. Minhas influncias foram os violonistas consagrados da poca: Bream, Williams e Yepes. Depois vieram Russell, Barrueco e os Assad, lembra Wolff. Antes de estudar em Nova York, onde teve aulas com o mito Manuel Barrueco, entre outros grandes msicos, o violonista passou uma temporada no Uruguai, onde se formou pela Universidade de Montevidu. Tinha 17 anos e foi muito importante para mim, tanto na minha formao musical como pessoal. Fui para l sozinho e tive de amadurecer bastante em pouco tempo. Valeu a pena, disse ele, que estudou com mestres como Abel Carlevaro, Guido Santrsola e Eduardo Fernandez.

Alm de concertista, Wolff tambm compositor e um dos grandes arranjadores brasileiros para violo, com peas gravadas por violonistas de peso como Sharon Isbin, Carlos Barbosa-Lima, Berta Rojas, Eduardo Castaera e Paulo Martelli. No meio acadmico brasileiro, o violonista tem um papel importante: foi o criador do curso de mestrado em violo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde professor. O Programa de Ps-Graduao em Msica da UFRGS o mais conceituado do Brasil, segundo avaliao do MEC. E com a Flvia Domingues Alves e o Paulo Inda estamos fazendo um belo trabalho com a graduao, disse orgulhoso. Daniel Wolff atualmente est em Berlim, Alemanha, fazendo ps-doutorado e ensinando como professor visitante na Universitt der Knste. Tambm tem aproveitado sua estadia no Velho Continente para dar seqncia sua agenda de concertos e masterclasses. A Violo Pro conversou com o violonista, que falou da carreira, dos trabalhos atuais e projetos futuros.

 

Violo PRO Voc est com um CD novo com transcries de obras famosas de Beethoven, Schubert e Chopin ao lado do violonista alemo Daniel Gritz. Como surgiu a idia desse repertrio e como foi adapt-lo para o violo?

Daniel Wolff - A idia comeou quando eu e o Daniel Grtiz fazamos doutorado em Nova York. Eu estava ouvindo muito as sonatas de Beethoven. Uma das minhas favoritas a Op. 31 N. 2, conhecida como Tempestade. Fiz o arranjo e gravamos, depois pensamos em outras obras para piano do sculo XIX para completar o disco. Escolhemos os Momentos Musicais, de Schubert, e duas valsas de Chopin. Nessa poca, j estvamos morando em pases diferentes, eu no Brasil e o Gritz na Alemanha. Fomos revisando os arranjos por e-mail. Ele veio ao Brasil para a gravao e depois masterizamos na Alemanha.

Atualmente voc faz ps-doutorado na Alemanha. Como isso aconteceu?

Minha vinda foi possvel graas a uma bolsa da Capes, para eu desenvolver um projeto de pesquisa sobre arranjos para violo na Universitt derKnste, em Berlim, onde estou lecionando este semestre. Tambm leciono violo na Hochschule fr Musik Hans Eisler e fao concertos.

Em 2006, voc lanou o elogiado CD Coisas da Vida, de repertrio popular e com outro duo, ao lado do clarinetista Wilfried Berk. Como surgiu a idia desse CD? Pensa em dar continuidade a esse trabalho?

A idia do disco surgiu em 2004, quando eu e o Wilfried tocamos um concerto juntos em Hamburgo. Ele tinha ouvido meus CDs e me convidou para tocar com ele. Aproveitamos o repertrio tocado e outras peas de autores brasileiros. Arranjei duas msicas do Gaudncio Thiago de Mello para o disco. Como eu e o Thiago trabalhamos juntos h muitos anos, o convidamos para tocar percusso orgnica. Aproveitando que estou na Alemanha, vou fazer concertos com o Wilfried com o repertrio do CD.

Voc o primeiro violonista brasileiro a obter o ttulo de doutor, pela prestigiada Manhattan School of Music. Como foi essa experincia por l?

A experincia de morar numa cidade cosmopolita e efervescente como Nova York algo especial. A cidade oferece um grande nmero de opes culturais. A Manhattan uma escola excelente, com departamentos de jazz e msica erudita, grupos instrumentais e vocais, big bands, orquestras, laboratrios, enfim, uma estrutura muito propcia para o desenvolvimento musical dos alunos.

No caso especfico do violo, o corpo docente da escola era excepcional: Barrueco, Barbosa-Lima, Delpriora, Goluses e Sharon Isbin. Vrios violonistas brasileiros de renome estudaram l.

O Rio Grande do Sul abrigou, nas dcadas de 1970 e 1980, um dos mais importantes eventos violonsticos brasileiros, os Seminrios de Violo Palestrina. Voc chegou a participar de algum desses seminrios?

 O primeiro concerto de violo a que assisti na vida foi num Seminrio do Palestrina, no qual os Assad tocaram o concerto do Gnattali e o Odair tocou o Concerto de Aranjuez. Nada mal para o primeiro concerto, no ? Mas na poca da maioria dos Seminrios eu ainda era criana, nem tocava violo. Ento participei de apenas dois, como aluno. E toquei e dei aula no de 1994.

Voc criou o curso de mestrado em violo na UFRGS e professor dessa instituio. O que um aluno pode esperar do Daniel Wolff como professor? Como so suas aulas?

Varia muito de um aluno para outro. Procuro saber do aluno como ele quer tocar e quais so seus objetivos e, com base nisso, decido como orient-lo. Alguns aspectos nos quais sou bastante insistente so: conhecimento musical e histrico do estilo da obra, escolha da digitao com base na interpretao e conscientizao neuromotora para solucionar os problemas tcnicos. Mas tento fazer isso em clima descontrado, brinco bastante nas aulas, porque a experincia musical tem de ser divertida.

Voc uma referncia entre os arranjadores para violo e tambm compositor. Quando comeou a compor e a fazer arranjos?

 Comecei a fazer arranjos logo que comecei a estudar violo clssico. Meu pai estudava piano na poca e eu, com vontade de tocar as peas que o ouvia praticar, comecei a adapt-las ao violo. A composio veio mais tarde, quando j tinha estudado orquestrao, harmonia, contraponto, improvisao, etc.

Voc comercializa vrios arranjos diretamente pelo seu website. Acha esse o melhor caminho, no pensa em public-los do modo convencional, por uma editora? O que acha do mercado editorial?

 No conheo tanto assim o mercado editorial. O Dean Kamei, dono da Guitar Solo Publications, me disse que a coisa no anda boa, no. Estou publicando as partituras do meu CD com o Gritz na Alemanha, pela Editions Margaux. Deve sair nas prximas semanas. Assim, poderei ter uma idia melhor de como est o mercado. Sobre as partituras do site, recebo muitos pedidos e essa foi uma maneira simples de poder distribu-las, mas toma bastante tempo resolver as questes de direitos autorais.

Como faz para conciliar tantas atividades e ainda manter a forma como instrumentista? Tem uma rotina de estudos?

No fcil conciliar tudo. O jeito ser organizado, para distribuir bem o tempo entre as atividades. E tento alternar um pouco. Por exemplo: quando possvel, evito ter de escrever um arranjo orquestral e tocar um concerto com programa novo na mesma semana. Tambm fao esporte regularmente, pois preciso estar em forma para ter energia para fazer todas essas atividades.

O que voc acha do atual momento do violo no Brasil?

H muitos bons jovens violonistas e compositores. A coisa vem ficando mais profissionalizada, h mais lugares para fazer curso superior, mais escolas de qualidade. Os msicos esto aprendendo a lidar com outros aspectos, como elaborao e produo de projetos culturais. H mais opes de captao de recursos via leis de incentivo fiscal e, devido aos avanos tecnolgicos, temos um nmero maior de CDs gravados e um acesso sem precedentes ao que produzido no resto do mundo. O nvel est alto, felizmente. J quanto a lugares para tocar, o Brasil ainda deixa a desejar. Na Alemanha, por exemplo, grande parte das igrejas tem sries de concertos de cmara, mesmo em cidades bem pequenas. Isso abre muitas opes de locais, deveramos tentar implantar essa idia no Brasil.

Onde pretende chegar como violonista?

Isso perigoso. Se temos um objetivo especfico demais, quando o alcanamos, no tem mais para onde evoluir. Quero sempre melhorar como msico e como ser humano. At onde vou chegar, s vou saber quando chegar l.

H algum projeto novo de gravao que pretende fazer?

H vrios projetos, quase todos de CDs de violo, solo ou em conjunto. Mas tem um projeto diferente, que o de gravar minhas canes populares com banda (piano, baixo, bateria, etc.). Tenho canes com textos de vrios autores, que ainda no foram gravadas.

Quais so seus planos para o futuro?

Alm de continuar o que j fao, gostaria de expandir o projeto Sarau no Hospital, que desenvolvo em Porto Alegre. um projeto muito bonito, com recitais e oficinas dos alunos e professores da UFRGS no Hospital de Clnicas de Porto Alegre. Quero levar o projeto a outros hospitais no Brasil e estou tentando implant-lo aqui na Alemanha. E, assim que possvel, quero oferecer o curso de Doutorado em Violo na UFRGS.

 

Site www.danielwolff.com